presença invisível.

Eu sinto uma vontade imensa de cheirar as roupas da mamãe, para que seu perfume me lembre de cada tom que ela usava quando, cansada, falava comigo, e ria, e era absurda, e me fazia rir. E depois, uma vontade imensa de dormir usando alguma blusa do papai, ao qual sempre chamarei assim, de papai, para me sentir protegida pela sua lembrança. Graças ao bom Deus, eles ainda estão aqui, comigo. E eu posso vê-los, examiná-los, e amá-los pessoalmente. Mas eu sinto sempre como se não fôssemos próximos, como se os olhasse por detrás de um vidro molhado pela chuva e embaçado, o qual esfrego para poder ver melhor através dele.
E eu olho no espelho e não me reconheço. É como se fosse a primeira vez que me vejo. Quem sou eu e porque me odeio tanto? Eu sou só uma menina que gosta de escrever e de dançar, e que tenta ser engraçada às vezes e fazer alguns amigos. Talvez seja pouco para os 17 anos, porém, acho que é mais até do que uma garota precisa.
Ah, às vezes eu queria deixar de querer ser esperta, e ser só uma criatura que precisa de proteção na casa dos pais, e eu queria que eles fossem me levar ao colégio ainda e me dar beijos de despedidas, mas esse tempo já se foi. Eu queria, mais uma vez, ao menos, que a mamãe me colocasse para dormir, e, como antigamente, eu não iria me mexer para não tirar de mim o lençol, do jeito que ela o colocou. Eu me lembro da última vez, na casa nova, e ela me dizendo que eu já estava bem grandinha. Sei que se ela tivesse continuado, um hora, eu iria me cansar de ser tratada como criança, e iria reclamar a minha independência, mas, de qualquer forma, muitas vezes ainda eu sentiria falta do seu olhar de boa noite.
Vocês me completam de uma forma que me assusta, porque mesmo tendo ainda suas presenças, o meu maior tesouro, eu choro muito, e sofro muito, quando não estou com vocês. Como se não mais pudesse estar. Queria um dia que vocês lêssem isso, ou queria ter coragem novamente, a que, mesmo sendo apenas uma criança, eu já tinha, de escrever cartas falando do meu amor. E eu queria em cada dia sentar horas e falar da vida só por falar, mas ter esse momento com vocês.
E eu queria não parecer tão ingrata.
Mas eu só sei ser assim. Por dentro os amo demais, mas por fora sou fria, eu sei.
É que eu nunca aprendi a dizer eu-te-amos naturalmente.
Acho que só assim é que, depois de tanto ler em livros de poemas falar sobre, entendi a voz que cada coisa tem.

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