Minha vida de relógios

Vivendo uma semana morta. Os dias foram tomados igualmente pelo tédio. Já não há diferenças entre eles. Já não posso destingui-los.
Os ponteiros sem sincronia dos relógios sapateiam uma espécie de solidão, enchendo o vazio do quarto com lembranças inoportunas.
Eu sou uma prisão sem muros. - Você talvez também seja. Vivo os meu dias-sem-fim sem dar o melhor de mim, perdendo realizações e oportunidades. Pesco palavras miseravelmente no âmago da minha indiferença e há uma lista infinita de coisas a fazer, mas mexer em qualquer parte de mim, tirar-me daqui, não é aconselhável.
Debussy preenche minha cabeça juntamente a uma covardia gigante de viver.
É que não consigo dizer nada a eles. Eu não pedi que viessem, não pedi que ficassem, não pedi companhia. Não encomendei ninguém. Eles, apenas, chegaram e foram se envolvendo comigo, se envolvendo, envolvendo, volvendo, vendo e vivendo por perto. E eis-me assim, agora; prendendo-os nessa prisão sem grades enquanto eles choram tantas necessidades a mim, porém eu nada sou. Só tenho um vazio completo impostor.
É horrível quando escrever passa a ser uma obrigação. E se não houver nada para ser dito hoje? O que ocupará aquela inscrição? O que fará meu nome? O que será da minha loucura?
Vivendo sempre nessa perseguição: eu, atrás da vida, que por sua vez vai atrás da morte, logo a que vive atrás de mim. - Eu sou uma prisão sem portas.

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